Eletrobras confirmou que o Complexo Tapajós vai ser construído, mas diz que "impactos serão o menor possível"
Manaus, 06 de Maio de 2011
Elaíze Farias
Indígenas da etnia munduruku, do Pará, temem que obras do PAC causem danos a suas terras |
Além de provocar sérios danos às terras indígenas do povo munduruku, a migração para o estado do Amazonas vai aumentar com a construção do Complexo Tapajós, composto por cinco hidrelétricas na calha do Tapajós (PA), afluente do rio Amazonas.
Esta é a avaliação de Telma Monteiro, coordenadora de Energia e Infraestrutura Amazônia da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé.
“Todas essas hidrelétricas construídas na Amazônia próximas ao Amazonas vão afetar o estado. Isto acontecerá em Jirau e Santo Antônio, em Rondônia, e com Tapajós, no Pará. Há um risco muito grande”, comentou Telma, ao acritica.com.
Telma elabora atualmente um relatório sobre os impactos que serão provocados pelo Complexo Tapajós.
A calha do Tapajós fica localizada na região do município de Santarém (PA), na divisa com o Estado do Amazonas, e abrange outros municípios vizinhos.
Segundo Telma, os municípios amazonenses que poderão ser mais diretamente afetados são localizados na região do baixo rio Amazonas, como Parintins e Nhamundá. “Pode ocorrer ocupação desordenada, inchaço das cidades”, disse ela.
Telma cita com exemplo do “inchamento” das cidades a situação registrada na região de Porto Velho (RO), onde, segundo ela, aumentaram as áreas de favelas e pontos de prostituição.
Tapajós
Os impactos das hidrelétricas do Tapajós, contudo, não se limitarão à explosão demográfica. Os riscos maiores são os impactos sociais e ambientais, com danos às espécies da fauna e flora e invasão de terras indígenas, além de especulação imobiliária, segundo Telma.
Inventário a que Telma Monteiro teve acesso apontou que os impactos serão perdas de ambientes ecologicamente estratégicos para reprodução de espécies aquáticas, peixes, répteis e mamíferos; perda de regiões com potencial pesqueiro para espécies comerciais alimentares; perda de regiões com potencial pesqueiro para espécies comerciais ornamentais; comprometimento de rotas migratórias; alterações da qualidade da água.
Ela criticou a propaganda do governo federal baseada no “novo conceito” de construção de hidrelétricas inspirado em plataformas de exploração de petróleo em alto mar.
“O material impresso, com conteúdo que considera a construção iminente, fato consumado, desconsidera o processo de licenciamento ambiental e não menciona os impactos socioambientais, mas já foi distribuído à população dos municípios da região”, diz Telma.
Indígenas
De acordo com Telma, os impactos previstos com a construção de hidrelétricas no rio Tapajós atingiria duas terras indígenas, além de afetar diretamente outra, a Terra Indígena (TI) Kayabi, que acompanha o rio Teles Pires por 280 km.
“O município de Jacareacanga é considerado uma "cidade" indígena com 60% de seu território cercados pelas terras dos Saí Cinza, Mundurucânia, Kayabi e Munduruku. A Terra Indígena Munduruku é a maior e ocupa 12% da bacia do Tapajós”, relata.
Telma destacou que os Munduruku vivem no ambiente da floresta e nas áreas de savana da Amazônia, chamadas de “campos do Tapajós”, no próprio vale do rio Tapajós.
No final do mês passado, em um encontro ocorrido no município de Jacareacanga (PA), cerca de 70 indígenas representantes de 19 aldeias revelaram-se preocupados com o processo de construção de hidrelétricas na região. Ao final, uma carta foi elaborada, contendo vários itens contestando os empreendimentos.
Sustentável
A assessoria de imprensa da Eletrobras, questionada pelo portal acritica.com, enviou nota explicando alguns itens do processo de construção da hidrelétrica de Tapajós.
Explicou que “de todas as usinas do Complexo Tapajós estão na fase de Estudos de Viabilidade Técnica. A mais adiantada é a usina de São Luiz do Tapajós”.
A assessoria informou que o complexo Tapajós é composto por cinco usinas hidrelétricas, com uma capacidade total de 10.682 megawatts de potência, e que nenhuma delas vai atingir terras indígenas.
Conforme a assessoria, a Eletrobras entende que “no Brasil o grande potencial hidrelétrico encontra-se na Amazônia, o que implica maiores desafios”.
De acordo com a Eletrobras, “o projeto Tapajós inaugura um novo conceito de usinas plataforma, onde neste caso o impacto sobre meio ambiente será o menor possível”.
No texto enviado à reportagem, a assessoria diz que “na fase de construção o desmatamento será mínimo e haverá a recomposição da vegetação, evitando a implantação de vilas nas proximidades da obra. Na fase de operação serão utilizados recursos técnicos de automação para reduzir o número de trabalhadores, que se revezarão em turnos técnicos”.
A assessoria informou que no complexo Tapajós, são 200.480 quilômetros quadrados de áreas de preservação para 1.979 quilômetros quadrados de intervenção – o que resulta em 101 quilômetros quadrados preservados para cada quilômetro quadrado de intervenção no ambiente natural.
A atual fase do complexo ainda antecede a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental (EIA). Ainda não há previsão de início das obras.
A Assessoria de Imprensa da Eletrobrás justifica os danos do projeto 'Complexo Tapajós' afirmando, comparativamente que:
ResponderExcluir‘são 200.480 quilômetros quadrados de áreas de preservação para 1.979 quilômetros quadrados de intervenção – o que resulta em 101 quilômetros quadrados preservados para cada quilômetro quadrado de intervenção’, como se fosse uma mera relação matemática, ‘dando’ 101km2 ‘preservados’(?) para cada 1 km2 inundado.
Esta relação é apresentada em referência à um ambiente natural, florestal Amazônico, cheio de vida, refúgio, incubador e sustentador de incontáveis espécies conhecidas e não conhecidas, vivendo ainda em simbiose, numa ‘Teia de Vida’ inconcebível, que nem os mais peritos biólogos conhecem na totalidade.
A inundação de mata/vegetação ribeirinha (APP) causa o enterrompemento em cadeia de corredores biológicos fundamentais para a manutenção, ao longo do tempo, da totalidade de espécies da região maior.
A inundação de segmentos de rios interrompe os ‘veios da vida’, causando o isolamento e extinção local e regional de populações de espécies.
É fato que a extinção de populações de espécies acelera a extinção em cadeia de outras populações de espécies ao longo do tempo, especialmente das espécies mais especializados e vulneráveis, nos quais muitas outras espécies dependem direta ou indiretamente.
A ‘Teia da Vida’ não é calculada matematicamente em km2, como os técnicos pretendem. A complexidade simbiótica dos meios de sustentação biológica da vida é muito além da compreenção, do conhecimento e dos calculos humanos.
A preservação não se mede em quilômetros quadrados, mas sim na conservação do conjunto de extensões florestais e especialmente da vegetação florestal ciliar próxima aos rios, e cursos hídricos afluentes, interligados à todo o complexo hídrico - biótico da região maior.
Antes de tudo, a preservação é uma questão BIOLÓGICA, e não geográfica – física de ‘quilômetros quadrados preservados’ versos ‘quilômetros quadrados de intervenção’.
Esta visão/explicação matemática, simplista do ‘Complexo Tapajós’ pela assessoria da Eletrobrás ignora a complexidade do conjunto hídrico-florestal-biótico da bacia Amazônica Tapajósem relação aos sistemas e mecanismos de manutenção - sustentaçãode espécies ao longo do tempo e espaço.
A interdependência e as dinâmicas de um mega conjunto de nichos, corredores e habitats florestais, interligados, que sustentam uma fantástica e importantíssima riqueza biológica são, em grande parte, pouco conhecidas.
A complexidade, a riqueza biológica - florestal Amazônica a assessoria da Eletrobrás desconhece á favor das metas do ‘Macro Planejamento Hidrelétrico Nacional’
É preciso lembrar que 'A Extinção é para Sempre; a Preservação para as futuras gerações é para Agora.'
Peter Midkiff