quarta-feira, 13 de julho de 2011

Tapajós: recursos naturais da Amazônia valem quatrilhões de dólares


A bacia hidrográfica do rio Tapajós é uma das principais sub-bacias da bacia amazônica e tem cerca de 493.000 quilômetros quadrados onde vivem 820.000[1] pessoas (Censo Demográfico 2000, IBGE[2]). O rio Tapajós é formado a partir do encontro dos rios Juruena e Teles Pires, na divisa dos estados de Mato Grosso, Amazonas e Pará e desse ponto ele avança 825 quilômetros para desaguar na margem direita do rio Amazonas. Os rios Jamanxim e Arapiuns, ambos totalmente no estado do Pará, são os maiores tributários do rio Tapajós.

Telma Monteiro

Um estudo do coordenador de sustentabilidade ambiental do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), José Aroudo Mota , divulgado hoje (13), aponta que os recursos naturais da Amazônia valem alguns quatrilhões de dólares.O governo brasileiro pretende usar esses recursos naturais para transformar o Brasil na quinta maior economia do mundo. Para chegar lá, o modal hidroviário, baseado na experiência holandesa, é considerado o principal meio. Seminário em Brasília, organizado pelo DNIT, apresentou um conjunto de propostas com a finalidade de orientar políticas públicas de aplicação de tecnologias e de métodos de planejamento. O governo federal quer aproveitar o modelo que levou a Holanda a desenvolver uma estratégia logística para manter seu poder comercial na Europa. Quem estudou história sabe que os holandeses são mercadores por tradição.

 O seminário, também teve como objetivo trazer para o Brasil uma leitura moderna – como se isso fosse possível - dos 450 anos de transporte hidroviário holandês para aplicá-lo como modelo a ser seguido na Amazônia. O primeiro Termo de Cooperação entre Brasil e Holanda é de 2008, assinado em Haia; depois, em 2009, foi assinado um Protocolo de Cooperação em Brasília; e finalmente em abril de 2010 foi assinado um Plano de Trabalho que levaria os representantes das instituições brasileiras à Holanda, visando o acompanhamento do Plano Hidroviário Estratégico (PHE) e o Curso de Capacitação em Navegação Interior na Holanda.

Veja-se que a pretensão vai muito além de aumentar a nossa capacidade logística emperrada há anos pela corrupção no Ministério dos Transportes. Na verdade esses planos mirabolantes para transformar a Amazônia num grande corpo de artérias navegáveis, à semelhança de países como Holanda e Bélgica, estão centrados em um modelo medieval que levou à ocupação industrial das margens dos rios junto com a destruição da vida que havia neles.  

A Holanda enxerga o Brasil em números: 5ª maior superfície mundial (205 x Holanda); 4ª maior população mundial e, portanto, importante mercado interno (Brasil 190 milhões, Mercosul 240 milhões); principal mercado emergente na América do Sul; diversas oportunidades regionais; diversas oportunidades setoriais[3] .


Contrastes: a Holanda tem 41.864 km² e 16 milhões de habitantes. A bacia Amazônica abrange uma área de sete milhões de km² dos quais 3,8 milhões de km² encontram-se no Brasil. Com o potencial logístico esgotado na Holanda, as grandes empresas holandesas estão buscando a alternativa de expansão no emaranhado de rios brasileiros na Amazônia.  O planejamento das cidades holandesas se deu exclusivamente com a implantação de atividades industriais nas  margens dos rios e canais. É exatamente isso que estão querendo fazer com a Amazônia!

Como é o Complexo Tapajós?

Na esteira dos planos para construção de mega-empreendimentos hidrelétricos na Amazônia foi elaborado o “Estudo de Inventário Hidrelétrico do rio Tapajós e Jamanxim” que identificou o potencial de sete aproveitamentos hidrelétricos com potencial de 14.245 megawatts (MW) de capacidade instalada[4].

Os estudos indicaram um conjunto de aproveitamentos em cascata, no rio Tapajós e no seu principal tributário, o rio Jamanxim. O Ministério de Minas e Energia (MME) considerou que é estratégico para o Brasil explorar esse potencial de energia. Mas não explicou o porquê. O projeto hidrelétrico de São Luiz de Tapajós, o maior aproveitamento da bacia do Tapajos está previsto no Plano Decenal de Energia (PDE) 2020.  

Em 2010, depois de realizado o inventário para identificar os aproveitamentos hidrelétricos na bacia hidrográfica do Tapajós, foram apresentados também os estudos da Avaliação Ambiental Integrada (AAI) do rio Teles Pires e do rio Juruena, os dois rios que se juntam e formam o Tapajós. Esse parece ser apenas o início de um grande processo de apropriação e privatização dos recursos da Amazônia, incentivado pelo governo, em parceria com grandes empresas nacionais e internacionais e financiamento do BNDES. Projetos de lei estão tramitando[5] céleres no Congresso para viabilizar a construção de eclusas – para transposição de desníveis - simultaneamente à construção de barragens em rios navegáveis e não-navegáveis. Entre os projetos que estão sendo priorizados está o da Hidrovia Tapajós – Juruena -Teles Pires[6].

O governo brasileiro anunciou que o Complexo Tapajós, que está no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), seria leiloado em 2010, o leilão foi transferido para 2011. E já há previsão de que a primeira usina comece a operar em 2016. Os estudos de inventário foram entregues à Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) deverá emitir em breve o Termo de Referência para a primeira usina, São Luiz do Tapajós, para a elaboração dos Estudos de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA).

Uma medida provisória a ser editada ainda este mês (julho) promoverá a redução do Parque Nacional da Amazônia e das florestas nacionais de Itaituba 1 e 2, para evitar conflitos no processo de licenciamento ambiental das usinas do Tapajós. Duas das usinas do complexo afetarão diretamente as unidades de conservação. Pelas notícias essa redução está se dando a pedido da Eletronorte e sem os estudos necessários. Mais uma vez o Ibama sofre as pressões políticas impostas pelas necessidades inexplicáveis das empresas estatais. Eletrobras, uma Petrobrás da energia? Ridículo.

Com a hidrovia Tapajós-Teles Pires-Juruena, o governo brasileiro quer criar uma nova estrutura organizacional calcada em modelo internacional, em especial no holandês, para viabilizar a implantação de cerca de 20 mil quilômetros de malha hidroviária navegável só na Amazônia.  As hidrovias passaram a ocupar um papel importante nas diretrizes do governo brasileiro, do Ministério dos Transportes em especial, com a desculpa de reduzir os custos internos de transporte de commodities e dar competitividade às exportações.  Custos internos?

Enquanto isso as estradas que tanto mal causaram e que já rasgaram a Amazônia, induziram à ocupação predatória, grilagem, pressionaram o desmatamento e o comércio de madeira ilegal, continuam se desmanchando sem os recursos que sabidamente escoaram para o ralo da corrupção.
Continuação: Ocupação etno-histórica da bacia do Tapajós


[1] Municípios paraenses da Bacia do rio Tapajós têm 531.515 habitantes  (IBGE, 2010)
[2] Ainda não há atualização do Censo de 2010 para bacias hidrográficas
[3] Chamada para o Seminário: “A visão holandesa sobre o Brasil e sobre a cooperação bilateral”
[4]  Estudos de Inventário Hidrelétrico das Bacias dos Rios Tapajós e Jamanxim - Centrais Elétricas do Norte do Brasil S. A. – Eletronorte e Construções e Comércio Camargo Corrêa S.A. – CCCC - 2008
[6] Projeto Norte Competitivo – Macrologística, disponível em http://www.macrologistica.com.br/9512.html  acessado em 18 de janeiro de 2011

5 comentários:

  1. APROVEITEM PARA FAZER MANIFESTACAO CONTRA A OCUPACAO DE TERRAS INDIGENAS BRASILEIRAS POR BASE DE EXERCITOS ESTRANGEIROS!!! ISTO MOSTRA A FRAGILIDADE DESTE CONCEITO DE NACAO INDIGENA, POIS PERMITE QUE NEGOCIEM A EXPLORACAO DAS RIQUEZAS DIRETO COM OS ESTRANGEIROS...
    TENTEM RECUPERAR O QUE ESTA SENDO USURPADO DE NOSSO BRASIL!!! POR ISTO SIM VALE A PENA SE MOBILIZAR POIS NAO TEM BENEFICIO ALGUM PARA O BRASIL, SOMENTE PERDAS!!! UMA GRANDE PERDA PARA TODOS OS BRASILEIROS!!!

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  2. Telma, estou horrorizado com tudo isso que querem fazer na Amazônia! Eles agem como se estivessem no quintal da própria casa deles, lixo no canto, um buraco aqui, um cachorro enterrado ali, como se tudo no Brasil fosse sua propriedade particular. Nunca vi coisa igual! E pior de tudo, ninguém liga, ninguém está nem aí com nada!

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  3. Telma.

    Como estava dizendo no twitter, alguns fazendeiros, começaram há poucas décadas a plantar e preservar madeira de lei, como uma forma de poupança para seus herdeiros.
    Enquanto o pais, toma outra via, devastar a floresta para retirar os recursos naturais.
    O tesouro da superfície será jogado fora, para buscar a fortuna do subsolo.
    Para as próximas gerações, sobrará somente o nada.

    Abraços

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  4. @anônimo: Mostre-nos uma prova, uma sequer, de ocupação de uma terra indígena por exercitos estrangeiros, ou (faltando isso), por estrangeiros. Verá que não existe isso. (Nem o General Augusto Henilson afirmou isso na entrevista na Radio Bandeirantes. E, ora, ele é contra a demarcação de reservas indígenas ne região de fronteira.
    Tais provas faltam. O que não faltam, são empresas multinacionais que, abertamente, exploram os recursos naturais do Brasil, exportando-os como matéria-prima e barata, subsidiada pelo governo, com isenção de impostos, energia subsidiada, empréstimos baratíssimos do BNDES, bem abaixo do valor de mercado, etc. etc. Ou seja, não há necessidade para outros países ocuparem militarmente a Amazônia, ou "manipular povos indígenas" para aproveitar-se dos recursos naturais, porque as necessidades são prontemente atendidas e financiadas pelo governo brasileiro. Belo Monte é a mesma história, as hidrovias do Tapajós, como Telma descreve, também.´Visa apenas a exportação de matéria-prima.

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  5. Oi Telma, gostaria de saber de onde você extraiu o segundo mapa publicado nesta matéria. Estou precisando muito de um mapa assim.

    Obrigado pela atenção!
    Paulo

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