terça-feira, 23 de agosto de 2011

Belo Monte: genocídio anunciado


Artigo escrito por J. Sulema Mendes de Budin[1]

Srs. presidentes do IBAMA e da Chesf - a minúscula é intencional, porque proporcional as suas “dimensões” como instrumentos de terceiro escalão desse “desgoverno”, que afronta os direitos mais básicos dos cidadãos.

Sr. Curt, ao confirmar de viva voz para a jornalista australiana o que todos os que conhecem as táticas e estratégias da indústria barrageira e seus acólitos já sabem, anunciando o genocídio dos índios (e demais opositores a essa barragem criminosa e desnecessária, como os ribeirinhos, os pescadores e as pulações tradicionais) que serão tratados “como os aborígenes” foram, na Austrália, se posicionou claramente dentro das técnicas reacionárias e neo-nazistas, que ignoram os direitos mais fundamentais do ser humano.

Com tantos títulos no CV, o senhor passará direto sobre todo o sistema legal deste país, tratando os índios com idêntico menospreso que os colonizadores e a ditadura militar. Se a OAB e o CNJ ainda mantiverem algum comprometimento com suas origens e história, o mínimo que deve lhe acontecer é ser expulso da primeira e penalizado pelo segundo, assim como os juízes pressionados que estão alegando “incompetência”, para fugirem às responsabilidades para com o sistema jurídico, que é o maior pilar do Estado de Direito.

O senhor é uma vergonha para a parte consciente da classe dos advogados, para os brasileiros e para os gaúchos, intrépidos defensores das suas tradições e direitos – se não sabe, procure a história da Revolução Farroupilha – e o próprio Judiciário do RS, sempre à frente em suas decisões, especialmente relativas ao meio ambiente e ás causas sociais, assim como o MPF/RS, que vem enfrentando interesses políticos e empresariais, na defesa dos direitos dos cidadãos e do meio ambiente.

O Sr. (Phd) Curt, como todo instrumentinho de segunda classe, arrogante prepotente e pretencioso, está confiante que as leis neste país não valem para os asseclas desse “governo”. Engano seu. Enquanto houver um mínimo de senso de justiça e anseio de verdadeira democracia num povo, cedo ou tarde, aqueles que cometeram crimes, como o senhor ao assinar a LI de Belo Monte, para defender interesses menores e escusos, contrariando os próprios técnicos do IBAMA que foram contra essa usina e o Painel de 40 especialistas, de reconhecida competência no Brasil e no exterior que provaram, tecnica e científicamente, desde os impactos sócioambientais em toda a Bacia do Xingu, como a inviabilidade financeira da usina, um dia serão punidos. Para cada Al Capone, há sempre um Elliot Ness!

Por favor, não nos envergonhe ainda mais com a sua desinformação sobre o órgão que está presidindo, afirmando para a imprensa o “papel do IBAMA não é proteger o meio ambiente, mas miniminizar os impactos”, o que demonstra sua completa ignorância sobre as finalidades e objetivos do IBAMA. Dê uma lida na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6931/81) art. 6º, IV, art. 10 § 4º, na Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9433/97) na lei que criou o IBAMA e, de passagem, no art. 213 e art. 5º da CF/88.

Aproveite para se inteirar sobre a Convenção 169 da OIT (com efeito vinculante) e demais Tratados Convenções e Declarações Internacionais que o Brasil assinou, se comprometendo a zelar pela integridade dos povos indígenas e das populações tradicionais, assim como a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas (que trata dos direitos das comunidades indígenas de todo o mundo) aprovada pela Assembléia-Geral da Organização das Nações Unidas, em 13 de setembro de 2007, contando com o apoio de 144 países, dentre os quais o Brasil. O descaso com essa Declaração, apesar de não ter efeito vinculante, mais uma vez, compromete a imagem do país por decisões ditatoriais e irresponsáveis de governo, que ignoram os direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente os mais frágeis.

Para seu conhecimento, a função primordial do IBAMA, como órgão executivo da PNMA não é “minimizar impactos”, mas sim “desenvolver atividades para a preservação e conservação do patrimônio natural...” E, entre os 14 objetivos finalísticos “definidos para sua missão institucional” estão:  “Intervir nos processos de desenvolvimento geradores de significativo impacto ambiental, nos âmbitos regional e nacional (04); Executar ações de gestão, proteção e controle da qualidade dos recursos hídricos (06); Manter a integridade das áreas de preservação permanentes e das reservas legais (07). (Fonte IBAMA).

Títulos à parte, já ouviu falar no princípio da precaução, inscrito no art. 255 da CF/88, que é a base do Direito Ambiental? Em síntese, a regra é que na dúvida prevalece a proteção ao meio ambiente. E na Lei de Crimes Ambientais? E na Convenção para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio (artigos I, II c) III, c), d), e), IV E VI) ratificada pelo Brasil em 15 de abril de 1952, através do Decreto 30.822/1956, e regulamentada pela Lei 2889/1956 (art. 1º, a) e c), além da Lei de Crimes Hediondos – Lei 8.072/ 1990  (art. 1º e § único). Esses crimes são imprescriptiveis e a responsabilização é abrangente e solidária!

Sr. José Ailton de Lima (com, sem ou apesar de títulos) sua posição é ainda mais penalizável que a do presidente do IBAMA, pelo acúmulo de funções, no Conselho do Consórcio Norte Energia. Contrate desde já um exclente advogado e peça ele que esclareça suas responsabilidades, inclusive face à legislação acima citada, entre outras. E, por favor, nos poupe de asneiras como a declaração recente que “os índios sairão por bem ou por direito”, porque o único “direito” que pode arrancar os índios e demais populações tradicionais das regiões a serem alagadas é o da força bruta, sem repaldo legal que, aliás, a indústria barrageira que o senhor serve, assim como esse governo anti-democrático e autoritário, não exita em utilizar.

Sua formação profissional como engenheiro, e seu carguinho de terceiro escalão na CHESF, não o desobrigam de um conhecimento mínimo das leis ambientais que estão sendo infringidas, assim como do conceito de genocídio, implícito na sua declaração pública e dos direitos dos povos indígenas violados covardemente pelos represamentos de rios para geração de energia elétrica, a serviço de interesses internacionais, respaldado no velho esquema de corrupção.

O senhor sabia que, entre tantas outras implicações, assim como os demais responsáveis pelo Consórcio pela construção, Licenças Ambientais, o diretor-presidente, Carlos Nascimento etc, pode ser submetido a julgamento por uma Corte Internacional, também por violação de direitos humanos e da Convenção 169 da OIT? Não fique tão tranqüilo por contar com a impunidade que vem manchando o sistema legal deste país, porque ela é transitória, assim como essa “chefia” que está exercendo, para “facilitar” as coisas. E por lá a situação é bem diferente porque o Brasil, como participante da sociedade internacional, obrigou-se a cumprir a Convenção 169, da OIT, o que lhe acarreta também responsabilidades específicas diante do Direito Internacional. (Para sua informação, o Brasil já acumula duas condenações internacionais pelas usinas do Rio Madeira).

Belo Monte é um crime ambiental do porte de Balbina, um crime social ainda maior contra comunidades indefesas e um crime econômico-financeiro contra o país, que vai dispender trilhões (incluindo dinheiro público do BNDES) numa usina desnecessária, economicamente inviável, quando não há recursos para a saúde (pessoas morrem nas filas do SUS, hospitais estão caindo aos pedaços e não há médicos suficientes) para a educação (milhões de crianças ficam sem escolas, sem professores, sem merenda escolar) para a segurança dos cidadãos (as polícias, além de mal pagas, não contam com equipamentos, nem sistemas nacionais de cadastros de criminosos).

Entre os princípios básicos para a interpretação das disposições da Convenção 169 da OIT, além da consulta e da participação dos indígenas, está o seu direito de decidir sobre suas próprias prioridades nas questões que afetem suas vidas, crenças, instituições, valores espirituais e a própria terra que ocupam ou utilizam.

Todas as vezes que os índios e demais populações tradicionais (que podem também ser consideradas como povos tribais para fins de aplicação da Convenção OIT 169 - o artigo 3º do Decreto nº 6.040, de fevereiro de 2007 define povos e comunidades tradicionais com todos os elementos e critérios estabelecidos no artigo 1º da Convenção 169 da OIT) se manifestaram em simulacros de “consulta”, foi contra Belo Monte. E o senhor tem a desfaçatez de afirmar que sairão “por direito”? O seu “direito” vai fazer correr muito sangue sobre o Rio Xingu. Mas é claro que o senhor, e os outros “responsáveis” pela obra não estarão lá!  A sua “coragem” e a dos demais implicados, não dá para tanto! Façam bom uso, o senhor o presidente do IBAMA os responsáveis pelo Consórcio para a construção, do seu “direito” de ficar bem longe. EU VOU ESTAR LÁ, junto com os Kaiapós e os outros índios, se eles me aceitarem, porque sirvo a uma causa justa e a minha coragem vai além de escrever este artigo.

Esse texto é de minha inteira e exclusiva responsabilidade. Quaisquer formas de reprodução e/ou veiculação, por quaisquer meios, não alteram nem minimizam essa responsabilidade.


[1] Cidadã brasileira, ambientalista, advogada e consultora em meio ambiente

Um comentário:

  1. Ao que parece, todos se sagraram vencedores do certame como se auto proclamam. Cada fonte beneficiada por sua especialidade. Eólicas, beneficiadas pelo baixo custo de capital e facilidades do câmbio. Térmicas a gás, pelo bom momento que o gás atravessa.
    Competição estranha essa! Como em “Alice no país das maravilhas” perguntaria com ar de espanto:
    --Quem vai ganhar o prêmio se os competidores chegaram juntos convergindo para o mesmo preço de 100R$/Mwhora? Valor pouco acima do preço de 80R$Mwhora das grandes hidroelétricas recém-licitadas.
    Isto mostra claramente que usinas de fluxo de vento ou de água não são melhores nem piores do que térmicas a gás. Dependem do contexto geográfico em serão inseridas em um sistema elétrico maduro, em evolução para um sistema hidrotérmico e diversificado.
    O Brasil terá excesso de energia elétrica nos próximos anos e não precisa de leilões de novas hidroelétricas. Precisa mais é da energia térmica, combustível para acionar os caminhões e tratores do agronegócio e mineração, especialmente do gás para acionar termoelétricas de complementação.

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