domingo, 8 de abril de 2012

Hidrelétricas, Rio + 20 e a fantasia


Fonte da imagem: Instituto Lula

 Ela [Dilma Rousseff] chegou a dizer que essas pessoas contrárias à construção das hidrelétricas vivem num estado de "fantasia".
Ao se referir à participação do Brasil na Rio+20, a conferência das Nações Unidas que será realizada em junho, na capital do Rio de Janeiro, a presidente lembrou aos que estavam na reunião que o mundo real não trata de tema "absurdamente etéreo ou fantasioso". "Ninguém numa conferência dessas também aceita, me desculpem, discutir a fantasia. Ela não tem espaço para a fantasia. (Fonte: Estado)

Telma Monteiro

O Brasil é o terceiro maior emissor de gases de efeito estufa (GEEs), perdendo apenas da China e dos EUA. O crescimento econômico, para países em desenvolvimento, custa caro e vem acompanhado também do aumento das emissões e acúmulo de GEEs na atmosfera, que geram impactos socioambientais. Clima com oscilações bruscas de temperatura, alteração dos níveis de precipitação são alguns dos desafios que é preciso enfrentar no século XXI.

O setor elétrico brasileiro é responsável por parte das emissões de GEEs, seja pela liberação do metano nos reservatórios das hidrelétricas, seja pela alteração do regime dos rios barrados, seja pelas emissões das termelétricas ou ainda por induzir a atividade humana de migração, ocupação e desmatamento de áreas de floresta. Por outro lado, as alterações do clima interferem nas vazões dos rios, na regulação das cheias dos reservatórios, na segurança das populações no entorno das hidrelétricas e na eficiência da geração.

As mudanças climáticas podem afetar, também, as crianças e a saúde mental das pessoas. Esse alerta foi publicado recentemente pelo Instituto do Clima, uma organização australiana de pesquisas que concluiu: "Os danos causados pelas mudanças climáticas não são só físicos. O passado recente mostra que os eventos climáticos extremos trazem também sérios riscos para a saúde pública, inclusive a saúde mental e o bem-estar das comunidades"[1].

Eventos extremos, desastres, danos ambientais e sociais, secas, inundações, ondas de calor, tornam vulneráveis adultos e principalmente crianças, diz o estudo.  Os efeitos das mudanças climáticas já são nítidos quando se trata de observar o estresse presente nas relações socioambientais. Populações tradicionais, em alguns casos, já são reconhecidas como verdadeiros refugiados climáticos.

Em uma matéria bastante contundente escrita por Julio Godoy, da Inter Press Service (IPS) -  A Mudança Climática por trás da Fome[2] - registra que uma seca severa pode ter causado a morte de pelo menos 30 mil crianças e atinge um total de 12 milhões de pessoas na Somália.  Esses fenômenos e as variações da temperatura no oceano podem afetar regiões como o Chifre da África. Temporadas de chuvas abundantes alternadas com secas e altas temperaturas já são cada vez mais frequentes nos noticiários internacionais e chamam a atenção para os efeitos nefastos na economia global.

Jean-Cyril Dagorn, encarregado dos programas de meio ambiente e justiça econômica do ramo francês da organização humanitária Oxfam, apontou que a seca é extrema e provoca uma catástrofe humanitária na Somália.  Alertou que “Chuvas torrenciais sobre terra extremamente seca arrasariam os solos mais férteis, tornando ainda mais dramática a crise de alimentos”.

Em 2010 o Fórum Nacional de Secretários de Estado para Assuntos de Energia (FNSE) entregou aos candidatos que concorreram às eleições presidenciais no Brasil o documento intitulado Descentralização e participação – planejamento e gestão do setor energético brasileiro[3] com o objetivo de contribuir com a formulação do planejamento energético nacional no programa do governo que tomou posse em 2011.

O documento conclui que a centralização do planejamento energético não leva em consideração as potencialidades energéticas regionais, daí a necessidade de uma revisão desse processo. A recomendação é que energia deve ser uma política de agências reguladoras de Estado e não de Governo e deve ser fiscalizada de forma independente.  (Fórum Nacional de Secretários de Estado - FNSE, 2010) Por outro lado, mesmo se não destacado no documento, será fundamental democratizar as agências reguladoras, garantindo participação e controle da sociedade, de modo especial dos cidadãos que pagam a conta mais alta pela energia.

Outro relatório[4], do Programa das Nações Unidas para Meio Ambiente (PNUMA), publicado em fevereiro de 2011, considera ser necessário investimento de 2% do PIB mundial a ser aplicado em um novo modelo econômico para combater a pobreza e gerar um crescimento genuinamente limpo e eficiente.  O percentual equivaleria a US$ 1,3 trilhão anuais.   

Esse investimento teria o objetivo de transformar a economia em uma economia  de baixo carbono em setores-chave, para valorizar uma economia natural. O relatório entende que esse seria o caminho para combater a pobreza. O setor energético se beneficiaria com o investimento na redução de CO2 e com a adoção de programas de eficiência energética, além de possibilitar o controle do aumento da demanda global por energia até 2050. (PNUMA, 2011)

Com as mudanças climáticas globais em curso ficam evidentes as oscilações de temperatura e dos índices de precipitação. Já não há mais dúvida de que populações, ecossistemas e biodiversidade sofrerão duramente as conseqüências. É o que diz o estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Economia das Mudanças Climáticas[5].

Como essas mudanças afetarão o Brasil, em especial a Amazônia, e com que intensidade, é o desafio a ser superado para se projetar os modelos de desenvolvimento da economia. Essas questões não discutidas em profundidade concorrem para aumentar os índices de pobreza e desigualdade social, conferindo às populações afetadas maior vulnerabilidade às mudanças climáticas.

A Rio + 20 vai priorizar a Amazônia ou a sua preservação também é fantasiosa?

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