Indígenas Munduruku Foto: Telma Monteiro |
Elaine
Patricia Cruz
Repórter da Agência Brasil
São
Paulo – A Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), que foi ratificada pelo Brasil, internalizada
pelo direito brasileiro em 2004 e dá aos índios o direito de serem ouvidos e
informados antes de que um empreendimento ou projeto governamental venha a
explorar os recursos das terras indígenas em suas comunidades, não está sendo
cumprida.
A
conclusão foi apresentada pela procuradora regional da República em São Paulo,
Maria Luiza Grabner, durante a oficina Os Povos Indígenas e o Direito à
Consulta Prévia, Livre e Informada, que terminou hoje (2) na aldeia Tenondé
Porã, em Paralheiros, na zona sul de São Paulo, e teve a participação de
lideranças de 12 aldeias de índios guaranis de São Paulo.
“[O
governo brasileiro] não tem cumprido a convenção da OIT”, disse Maria Luiza,
que participou da oficina, que é promovida pela Comissão Pró-Índio de São
Paulo. “Muitas vezes, o que vemos são arremedos de consulta ou oitivas, quando
o processo político já aconteceu e a tomada de decisões já ocorreu”, falou a
procuradora.
Um
informe divulgado pela OIT este ano mostrou que o direito à consulta pública no
Brasil não foi respeitado nos casos envolvendo a construção da usina de Belo
Monte, no Rio Xingu, por exemplo. Segundo Lucia Andrade, coordenadora da
Comissão Pró-Índio de São Paulo, as lideranças indígenas também relataram que o
mesmo ocorreu na obra de construção do Rodoanel, em São Paulo.
“Essa
é uma das maiores queixas dos povos indígenas. Os empreendimentos estão
acontecendo, os projetos de lei estão sendo aprovados sem que exista uma real
consulta. Muitas vezes, o que ocorre é uma comunicação, somente informando que
o projeto será realizado, mas sem que seja construído um acordo”, disse Lucia
Andrade.
Segundo
Renato Mendes, da Organização Mundial do Trabalho, a ratificação da convenção
pelo Brasil obriga que o governo informe aos povos indígenas e quilombolas
sobre obras que podem afetar a comunidade onde vivem.
“O
Brasil, nesse momento, após a ratificação da convenção, quer regulamentar um de
seus artigos, que se relaciona à consulta prévia, livre e informada, que é esse
direito. Povos indígenas e comunidades reconhecidas como sujeitos de direito,
como os quilombolas, têm o direito de, em qualquer obra ou ação da política
pública, legislativa, administrativa ou judiciária, e que possa afetar a vida e
o desenvolvimento desses povos, receber informação para saber as consequências
dessa tomada de decisão”, disse Mendes.
Caso
não seja possível um acordo entre as partes, será preciso estabelecer
procedimentos para minimizar os impactos negativos sobre a vida desses povos.
“A consulta prévia é um processo de negociação para chegar ao consenso”,
acrescentou.
Em
janeiro deste ano, o governo federal criou um grupo de trabalho para estudar,
avaliar e apresentar uma proposta de regulamentação dos procedimentos de
consulta prévia prevista na Convenção 169. A proposta deverá ser aprovada até
dezembro de 2013, após a realização de vários encontros regionais, em todo o
Brasil.
Conscientização -
A oficina Os Povos Indígenas e o Direito à Consulta Prévia, Livre e Informada
teve início na última sexta-feira (29) e terminou hoje (02) com a participação
de líderes indígenas de aldeias da capital paulista, do litoral sul e norte de
São Paulo e do Vale do Ribeira. A intenção de se promover a oficina, segundo a
procuradora Lúcia Andrade, é preparar os índios guaranis para participar do
processo de regulamentação da consulta prévia.
Para
os indígenas, a participação nas oficinas foi muito importante. “Como os
indígenas não saem muito das aldeias e preferem a tranquilidade, alguns acabam
não tendo muito conhecimento sobre projetos de lei e emendas que afetam seus
territórios e suas vidas. Como é uma oficina dentro da aldeia, isso ajuda
muito”, disse o índio Adriano Veríssimo (em guarani, Karai Poty), coordenador
educacional do Centro de Educação e Cultural Indígena (Ceci) e que vive na
aldeia Tenondé Porã.
“Até
sabia que existia a lei, mas nunca soubemos como deveríamos compartilhá-la”,
disse Alcides Mariano Gomes, cacique da aldeia Paranapuã, em São Vicente (SP).
“O governo brasileiro primeiro faz os projetos e vem com os projetos todos
prontos para apresentar aos indígenas e, dependendo da situação, acho que
deveria haver uma negociação. Não só para o lado dos brancos, mas para o lado
dos índios. Ficamos um pouco tristes porque não sabíamos [da convenção], mas
era um direito que estava sendo escondido”. Tudo o que aprendeu durante a
oficina, Alcides pretende compartilhar com sua aldeia.
Edição:
Fábio Massalli