A cidade de Porto Velho, a capital do estado de Rondônia, nunca esteve tão ameaçada pelas cheias do rio Madeira. Ensecadeira (barragens provisórias) e outras estruturas em construção na UHE Jirau poderão se romper se não houver um controle do nível do reservatório da hidrelétrica Santo Antônio. (Atualizado em 04/03/2014)
Telma Monteiro
Resgatando um pouco da história das usinas do Madeira
O Ministério Público Federal e o Ministério Público
do Estado de Rondônia ajuizaram uma Ação Civil Pública (ACP) com pedido liminar
contra a mudança de localização da usina de Jirau, no rio Madeira. Isso
aconteceu em 25 de agosto de 2008. A Agência Nacional de Energia Elétrica
(ANEEL), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA) e o Consórcio Energia Sustentável do Brasil (Enersus), hoje
ESBR, são os réus da ação.
Os autores da petição inicial, o Procurador MPF de
Rondônia, Heitor Alves Soares e a Promotora de Justiça do Estado de Rondônia,
Aidée Maria Moser Torquato Luiz,
pediram a anulação do Leilão n° 005/2008 e do respectivo contrato de concessão firmado entre a União e o consórcio ESBR. Para o MP o IBAMA não deveria ter concedido a Licença de Instalação que autorizou a construção do empreendimento na nova localização, 9,2 quilômetros rio abaixo, proposta pelos empreendedores.
pediram a anulação do Leilão n° 005/2008 e do respectivo contrato de concessão firmado entre a União e o consórcio ESBR. Para o MP o IBAMA não deveria ter concedido a Licença de Instalação que autorizou a construção do empreendimento na nova localização, 9,2 quilômetros rio abaixo, proposta pelos empreendedores.
Essa alteração em Jirau que aconteceu depois da
emissão da licença ambiental de localização e depois do leilão, se tornou um
precedente em processos de licenciamento de outras hidrelétricas, como no caso
perigoso de Belo Monte. O MPF do Pará ajuizou uma ACP questionando as
alterações no projeto de Belo Monte realizadas pós-leilão.
Os empreendedores de Jirau, na época, justificaram
que as mudanças na localização da usina levariam a uma economia de R$ 1 bilhão,
quase 12% do investimento total. Anunciaram a entrega da energia se daria antes
da data prevista em contrato. Jirau já está no sexto ano de construção e o
consórcio fez funcionar as primeiras turbinas em 2012.
Entre os benefícios prometidos com a alteração do
projeto estavam a redução dos impactos ambientais, a redução do volume de
escavações, redução dos custos e antecipação da geração. Mas parece que alguma
coisa deu muito errado.
Já no acórdão do TCU, sobre as contas de Jirau,
para acompanhar o leilão e outorga de concessão, ficaram patentes algumas
inconsistências nos números apresentados pela Empresa de Pesquisa Energética
(EPE). As mais gritantes se referiam à necessidade de adequação dos custos
indiretos, dos preços dos equipamentos eletromecânicos, seria preciso
considerar a questão da linha de transmissão não prevista no orçamento, que
terá que levar a energia por 130 quilômetros até a subestação nas proximidades
de Porto Velho, falhas de projeto, revisão da vazão no vertedouro e falta do
detalhamento do custo global da obra.
Apesar de tudo, independente das recomendações do
TCU, Jirau foi licitada. Uma briga entre os desenvolvedores do projeto, Furnas
e Odebrecht (que já haviam arrematado o leilão da usina de Santo Antônio) e os
vencedores do leilão de Jirau, GDF Suez e Camargo Corrêa, chegou à justiça. Os
primeiros com o gosto amargo da derrota pela perda de Jirau, uma surpresa para
o setor. Isso inviabilizou os ganhos de escala, planejados por Furnas e
Odebrecht, com a construção das duas usinas – Santo Antônio e Jirau.
O investimento total previsto para Jirau permaneceu
próximo aos R$ 9 bilhões, mesmo depois que a ESBR anunciou, em 2008, as
alterações no projeto. Não só não houve a tal redução de R$ 1 bilhão como foi necessário
fazer um aditivo de R$ 900 milhões ao contrato, para complementar os custos com
as obras civis. Atualmente o custo de Jirau ultrapassou em muito os
R$ 13 bilhões e o consórcio ESBR se queixou, na época, do aumento no volume das
escavações.
Erro de cálculo ou estratégia para obter mais
dinheiro do BNDES, nunca se saberá, já que não dá para aferir quanto foi
escavado ou qual teria sido a previsão original.
Hoje o desastre não está apenas anunciado, já está
confirmado.
Telma, acho que a noção do Visvanathan ajuda a pensar o tubo de ensaios que o rio Madeira foi transformado. Resgatei e atualizei uns escritos do mestrado:
ResponderExcluirDESENVOLVIMENTO COMO TERRORISMO.
O pensador indiano Shiv Visvanathan (Carnival for Science, 1997; indicação preciosa do Laymert) diz que, em nome do desenvolvimento, as populações dos países do "Terceiro Mundo" estão sendo submetidas a tecnologias viviseccionais, ou seja, são alvo de experimentação científica imposta em condições de simulação limitada, sem garantias de segurança. Para ele, as barragens se caracterizam como uma intervenção viviseccional ao requererem gastos massivos de capital, serem colocadas em funcionamento após limitada experiência de operação e em caso de falha catastrófica, o risco associado pode resultar em uma devastação em larga escala. Santo Antonio e Jirau foram construídas em um rio que ainda não se encaixou em sua calha. Os peritos ambientais e os ativistas já haviam alertado para isso: senhor de suas águas, o Madeira é imprevisível. Mesmo assim, governos, empresários, pesquisadores e toda sorte de apoiadores garantiram a execução deste projeto desastroso, manifestando em público sua crença no progresso. Com turbinas em formato e posicionamento inéditos nos rios da planície amazônica, construíram as usinas. Uma delas, instalada a sete quilometros do centro de Porto Velho, uma das hidrelétricas mais próximas de um grande centro urbano de que se tem notícias. Mais uma vez os movimentos levantaram a questão do risco e da necessidade de um plano de emergência eficaz, em caso de acidentes. Agora, aos milhares de atingidos arrancados de suas casas (muitos dos quais foram realojados em casas novas que já desmoronaram, em mais um dos experimentos da indústria barrageira), somam-se os outros milhares de desalojados pela maior enchente já registrada na história do Madeira. Todos se eximem de suas responsabilidades. Não é possível comprovar causa e efeito. Depois de descartarem os laudos técnicos dos analistas do IBAMA que recomendaram a suspensão do projeto e agora, quando precisamos com urgência da política, exigem rigor científico. Nos jornais, diz-se que essa é a prova de fogo das usinas, que estão testando a resistência de seus paredões. O experimento final. Outros, aterrorizam a população com a possibilidade de um tsunami que arrasaria nossa capital em poucos minutos, caso a estrutura de Jirau seja abalada. Torço, de verdade, para que as águas do Madeira dêem uma trégua e tudo se resolva de forma rápida, para minimizar as tragédias em curso e que, desde já, cada qual assuma o bagre que lhe cabe. O fato é que para muitos ribeirinhos o pesadelo do tsunami chegou faz tempo, junto com o adesivo "USINAS JÁ!". And keep calm, que ainda falta fazer Cachoeira Esperança e Ribeirão.
Não conhecia Shiv Visvanathan, e lamento isso. Peço licença de dar um CtrlV CtrlC e postar no me face. Também estou apavorada com política socioambiental do atual governo.
ExcluirTambien solicitamos permiso para publicar el texto citado, gracias
ExcluirTelma, quais suas credenciais e formacao? E importante sabermos a fonte dessa informacao ja que e sobre um assunto importante e assustador.
ResponderExcluirA qual ou quais informações você se refere? Se for sobre o rompimento da barragem, a informação não é minha, a fonte é http://www.rondoniadinamica.com/colunas/caldeirao-do-diabo,2275.shtml
ExcluirQuanto às minhas "credenciais e formação" basta consultar minha página no Facebook https://www.facebook.com/telmadm
E quanto a você? Me parece estar no anonimato. Grata por acessar meu blog.
Mais uma Kagada PTralha!!!
ResponderExcluirAqui en Beni Bolivia nosotros estamos llenos de agua muy afectados por jirau y santo antonio!
ResponderExcluirTelma, olá !
ResponderExcluirE, como sempre, conseguem tornar o Transporte Hidroviário INSUSTENTÁVEL ao não incluírem as Eclusas para a transposição do Desnível D'Água criado pela Barragem !