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As finalidades do BNDES me parecem antagônicas em relação a esse papel de receber e administrar fundos para preservar um bioma que ele mesmo não costuma respeitar. O BNDES é financiador dos grandes projetos estruturantes que têm destruído uma grande parte da biodiversidade amazônica, além de projetos agropecuários que impactam a floresta.
Telma Monteiro
Temer
viajou para a Rússia na semana passada e deu uma passadinha na Noruega para
conversar com as autoridades norueguesas sobre a montanha de dinheiro que eles
têm despejado no Fundo Amazônia. Como a Noruega, maior doadora do fundo,
ameaçou cortar o envio da grana que, em tese, ajudaria a controlar o
desmatamento da Amazônia, o governo Temer se preocupou. O governo da Noruega
tem razão, o desmatamento aumentou, mesmo com os já R$ 2,75 bilhões que doaram
para sua preservação.
Não
que eu ache a Noruega um poço de bondades. Ela têm que compensar suas emissões
e ainda manter sob controle os investimentos em petróleo que têm no Brasil. Mas,
num ponto eles, os noruegueses, têm razão. Afinal, com todo esse dinheiro
enfiado em projetos ambientais de instituições federais, estaduais, municipais
e do terceiro setor, aí incluídas grandes ONGs nacionais e internacionais, já
era para se ter resultados. O desmatamento na Amazônia não só não caiu, como
aumentou. Mais adiante, em outro artigo (parte 2) vou detalhar quanto e para
quem foi o dinheiro do Fundo Amazônia.
Nesse
entremeio, no entanto, existem pontos bastante obscuros sobre o uso do dinheiro
vindo da Noruega, que pretendo abordar em profundidade. Acredito que até agora
ninguém pesquisou em detalhes como o Fundo Amazônia tem sido gerido desde 2009
e que tipos de projetos está financiando. Seriam projetos que seguramente
fariam cair o desmatamento da Amazônia? Essa é a pergunta que não vamos
conseguir responder sem antes fazer um Raio-X de todo o processo. É o que
pretendo.
O que é o Fundo Amazônia, afinal?
Quando
foi instituído pelo Decreto 6.257 de 1° de agosto de 2008, o Fundo Amazônia
teria por “finalidade captar doações para investimentos não-reembolsáveis em
ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, e de
promoção da conservação e do uso sustentável da Amazônia Legal”.
Dentre os projetos a serem apoiados estariam a gestão de florestas
públicas e áreas protegidas, controle, monitoramento e fiscalização ambiental;
manejo florestal sustentável; atividades econômicas desenvolvidas a partir do uso
sustentável da vegetação; zoneamento ecológico e econômico, ordenamento
territorial e regularização fundiária; conservação e uso sustentável da
biodiversidade; e recuperação de áreas desmatadas. Está também previsto o uso
de 20% do Fundo Amazônia para monitorar e controlar o desmatamento em outros
biomas brasileiros e em outros países tropicais. Esse pedaço eu não entendi.
Prevenir e impedir o desmatamento na Amazônia Legal, para reduzir as
emissões de gases de efeito estufa é, na síntese, o principal objetivo para a
utilização dos recursos.
O governo da Noruega foi o primeiro e é o maior doador do Fundo Amazônia
(R$ 2,77 bilhões), seguido pela Alemanha (R$ 60,69 milhões) e em terceiro a
Petrobras (R$ 14,70 milhões).
Quem recebe, gere, destina e fiscaliza o
Fundo Amazônia?
Acredite, é o BNDES. Pode ser implicância minha, mas o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não seria a instituição pública
ideal para a missão, principalmente neste momento que o Brasil está vivendo. Ao
captar os recursos, contratar, monitorar projetos e ações, o BNDES estaria se
desviando do seu principal papel.
As finalidades do BNDES me parecem antagônicas em relação a esse papel
de receber e administrar fundos para preservar um bioma que ele mesmo não costuma
respeitar. O BNDES é financiador dos grandes projetos estruturantes que têm
destruído uma grande parte da biodiversidade amazônica, além de projetos
agropecuários que impactam a floresta.
São empreendimentos que desalojaram populações tradicionais,
sacrificaram a sustentabilidade e desmantelaram o equilíbrio dos povos
indígenas em suas terras. Projetos, só para citar um setor, como os das
hidrelétricas no rio Madeira, no rio Xingu, no rio Teles Pires e no rio Juruena,
além da ameaça de outros projetos hidrelétricos que paira sobre o rio Tapajós.
Como instituição, o BNDES, sob a mão pesada dos recentes governos,
contempla todos os segmentos econômicos como a agropecuária, indústria,
comércio e serviços, infraestrutura. Incentiva exportações e fortalece o
mercado de capitais. Aí está a incompatibilidade. Então, o que realmente
levaria o BNDES a abraçar a causa da preservação da Amazônia?
Uma de suas principais missões é investir em atividades que destroem o
meio ambiente, como a agropecuária e na Amazônia Legal. Prova disso é a recente
MP 756, que foi aprovada no Congresso e depois para a sanção de Temer que, às
vésperas de viajar para a Noruega, a vetou na íntegra. O motivo era tentar sensibilizar
os noruegueses, passando uma imagem de “amigo” do meio ambiente. Não colou.
Uma das consequências da MP 756, vetada por Temer, seria de legalizar
áreas já invadidas da Floresta Nacional do Jamanxim para expansão da
agropecuária, diminuindo a floresta preservada. Facilitaria, também, a
mineração ilegal de ouro na bacia do Jamanxim.
Certo, você me dirá que o Temer vetou a MP. Sim, só que isso não impediu
a Noruega de cortar parte dos recursos do Fundo Amazônia, já que se diz no
Congresso que nova medida, desta vez na forma de lei, substituirá a MP 756 e a
tramitação será de urgência. Portanto, o risco para a Flona do Jamanxim está
latente.
Os noruegueses ficaram de orelha em pé. Afinal, o BNDES está sob a mira
da Lava Jato com a delação de Joesley Batista que contou como recebeu do banco mais
de R$ 8 bilhões com ajuda de autoridades do governo.
No último aditivo do contrato com o Fundo Amazônia, de novembro de 2016,
o governo da Noruega prometeu doar mais R$ 334 milhões. Parece que vai ficar na
promessa.
E o dinheiro do Fundo Amazônia, que
cai no BNDES, para quem vai e para que tipo de projetos?
Para estados, municípios, instituições federais como a Fundação do Banco
do Brasil e o Terceiro Setor.
“Candidatos”
ao dinheiro do Fundo Amazônia não faltaram. Para se ter uma ideia, é uma
verdadeira sopa de letras em organizações não governamentais. Escolhi algumas
com os maiores valores. Ainda vou entrar em detalhes no próximo artigo para
fazer o leitor entender o que é o Fundo Amazônia, gerido pelo BNDES.
Mas
a organização que mais me chamou a atenção, por enquanto, chama-se Associação
Vale para o Desenvolvimento Sustentável – Fundo Vale. Pasme, foi criada pela
Vale, em 2009, e em 2016 obteve a aprovação de um recurso de R$ 35 milhões do Fundo
Amazônia para um projeto chamado “Renda Florestal”. Não é possível entender
como uma mega empresa poluidora como a Vale, que já recebeu o troféu da pior
empresa do mundo, devastadora, dona da Samarco, aquela que destruiu Mariana,
ceifou vidas, com o rompimento da barragem de rejeitos, ainda se beneficia dos recursos do Fundo Amazônia.
Além
do Fundo Vale, receberam muitos milhões em recursos, organizações como a WWF,
TNC, FAS, Fundação Banco do Brasil, IFT, FUNBIO, ISA, Kanindé, IDSM, IBAM,
ISPN, IPAM, Imazon, Embrapa, etc.
O
detalhamento e os quantitativos fica para a parte 2.
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