terça-feira, 11 de julho de 2017

Fundo Amazônia: o fundo do buraco? (2)

Desmatamento - Foto: Greenpeace
Telma Monteiro

E o dinheiro do Fundo Amazônia que cai no BNDES, para quem vai e para que tipo de projetos?

Dando continuidade à questão do uso dos recursos do Fundo Amazônia para reduzir o desmatamento, elejo a Floresta Nacional do Jamanxim o símbolo maior do descumprimento da legislação ambiental e da inutilidade de grande parte dos projetos que receberam rios de dinheiro do fundo, via BNDES.

A Amazônia perdeu, entre 2015 e 2016, 7984 km² de floresta, segundo o levantamento do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam).  Entre os municípios que mais desmataram estão cinco no estado do Pará: Altamira, São Feliz do Xingu, Novo Repartimento, Portel e Novo Progresso. Conforme tabela abaixo nota-se que o Estado do Pará foi um dos estados que mais recursos receberam do Fundo Amazônia.

Floresta Nacional do Jamanxim e Terra Indígena Munduruku
O município de Novo Progresso é onde está justamente a Floresta Nacional do Jamanxim. Aquela unidade de conservação que teria uma grande redução no grau de proteção, pela MP que Temer vetou antes de ir para a Noruega. O portal O Eco publicou em 25 de junho uma matéria em que alerta sobre o destino de Jamanxim. O ministro do Meio Ambiente, Saney Filho, revela o texto, deixou para o Instituto Chico Mendes (ICMBio) a responsabilidade de decidir sobre se o Projeto de Lei (desta vez não será uma medida provisória) que reduzirá a Flona Jamanxim, vai para o Congresso.

Floresta Nacional do Jamanxim e áreas invadidas (propriedades em amarelo)
O mais assustador é que o parecer do ICMBio já está pronto é admite a redução no grau de proteção da Flona Jamanxim em 486 mil hectares que serão transformados em Área de Proteção Ambiental (APA). Como já mencionei no texto anterior, esse bocado de floresta perderá seu status de preservação máxima com o único objetivo de legalizar a grilagem de terras e propriedades que estão dentro da Floresta Nacional do Jamanxim.

Localização da Floresta Nacional do Jamanxim e TI Munduruku no Estado do Pará
Entre as propriedades que precisam ser legalizadas, está uma grande área de Imóvel Rural de Assentamento de Reforma Agrária, dentro da Floresta Nacional do Jamanxim (figura abaixo), com 88.907 hectares, a maior propriedade dentro da Flona.


Então, para que serviriam os recursos do Fundo Amazônia, senão para impedir que o que grilagem e a ocupação promovida pelo próprio governo brasileiro em projetos de assentamento agrário avançassem sobre a floresta de preservação total?
Imóvel Rural de Assentamento de Reforma Agrária, dentro da Floresta Nacional do Jamanxim
Os projetos com recursos do Fundo Amazônia para “ajudar” a reduzir o desmatamento
Selecionei apenas alguns projetos (tabelas abaixo) para dar uma ideia de como milhões de Reais estão sendo utilizados para enxugar gelo. Alguns deles têm sido importantes para geração de trabalho e renda em pequenas comunidades, outros são visivelmente usados para manter as estruturas das próprias instituições ou ainda há os que não contribuem para a redução do desmatamento. Além disso, os projetos públicos, da União e dos estados são os que obtiveram os maiores recursos.



A organização Centro de Trabalho Indigenista (CTI), por exemplo, recebeu entre 2014 e junho de 2017, R$ 18.479.326,55, equivalentes a 97% dos recurso aprovado. As atividades realizadas começaram em 2015 com uma dezena de oficinas, intercâmbios entre indígenas, ações de monitoramento territorial, capacitação de servidores da FUNAI e 14 horas de sobrevoo.

Chamou-me a atenção, em especial, a Fundação Amazônia Sustentável (FAS), que recebeu numa tacada só, em 2016, R$ 10.235.460,00, equivalentes a 32% do total de 31.518.490,00 do projeto 2 (mostrado na tabela acima). Não aparecem (na atualização do site) as atividades realizadas, mas a proposta, em síntese, é de empoderamento das comunidades em Unidades de Conservação. O projeto 1, Bolsa Floresta – geração de trabalho e renda -  de 19.166.347,89, de 2009, recebeu 100% do recurso entre 2010 e 2014.

O corpo administrativo do FAS é que chama a atenção. O presidente do Conselho da Administração da Fundação Amazônia Sustentável (FAS) é ninguém mais, ninguém menos do que Luiz Fernando Furlan, ex-ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior no Governo Lula, entre 2003 e 2007. Luiz Furlan assumiu a presidência do Conselho de Administração da FAS ainda em 2007, quando o governo do Amazonas e o Bradesco fundaram a instituição.

O vice-presidente do Conselho da Administração da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), Lírio Albino Parisotto, é outro peso pesado do jet set brasileiro, o bilionário acusado de espancar Luiza Brunet. Mas não para por aí. Ainda tem a participação no conselho de José Melo Oliveira, Governador do Amazonas e Eduardo Braga, Senador da República. Será que não fica muito fácil ter projetos aprovados pelo Fundo Amazônia/BNDES, com tanto figurão assim?

Parte dessa dinheirama do Fundo Amazônia, gerido pelo BNDES, está indo para as mãos de algumas organizações sociais sem fins lucrativos, que também são patrocinadas por grandes empresas que têm interesses em investir na Amazônia. A União, Estados e municípios também buscam esses recursos. No entanto, os resultados estão aí, visíveis e noticiados. Até o governo da Noruega sabe.  Tivemos o pior resultado desde 2008, com crescimento de 30% no desmatamento, só no ano passado (2016), segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia.

Não quero questionar a importância do Fundo Amazônia para custear projetos que promovam atividades para evitar o desmatamento. Combate às queimadas, monitoramento por satélite, capacitação das populações que vivem nas florestas, postos de controle para coibir a derrubada, são ações imprescindíveis para a conservação da Amazônia.

O ponto é: como esses recursos estão sendo utilizados, por quem, com quais objetivos reais e interesses, em alguns casos; quais os critérios utilizados para a escolha dos projetos; principalmente, qual é o controle de acompanhamento exercido sobre os resultados efetivos das propostas.

Na semana passada, o Fórum de Entidades Empresariais do Pará assinou uma carta ao presidente da República pedindo a extinção do Fundo Amazônia. A alegação é de que os projetos do fundo “vem obstruindo os setores produtivos do Pará e da Amazônia”.  É a própria má administração do Fundo Amazônia que propicia esse tipo de atitude absurda. Mas, se o fundo não está ajudando a diminuir o desmatamento há quem se aproveite para desmoralizá-lo e pedir sua extinção.

O Fundo Amazônia estaria sendo usado, por algumas empresas, como uma espécie de “selo” para comprovar uma tal “responsabilidade socioambiental” e lhes conferir credibilidade internacional? A resposta é sim.

Já não é hora de fazer um balanço e uma auditoria no Fundo Amazônia/BNDES e descobrir por que o desmatamento só cresceu?

Clique nas doações para ver os diplomas emitidos em reconhecimento à contribuição do Governo da Noruega: 
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