O ativo circulante do FA está aplicado em fundos chamados Gaia I e Gaia II, geridos pelo Banco do Brasil, em aplicações financeiras de renda fixa - títulos públicos brasileiros. A posição, em 31 de dezembro de 2017, é de R$ R$ 3.201.236 mil, montante disponível para desembolsos em projetos. (RAFA 2017)
Telma Monteiro
O
Decreto 6.527, de 1º de agosto de 2008, instituiu uma “conta bancária
específica” que passou a ser chamada de Fundo Amazônia (FA). Criado pelo
governo federal, o FA é gerido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
e Social (BNDES). O BNDES contrata e monitora a captação de recursos. Em
síntese, o FA capta doações para a realização de aplicações não reembolsáveis
que, teoricamente, pretende empregar em ações de prevenção, monitoramento e
combate ao desmatamento, e de promoção da conservação e do uso sustentável da
Amazônia Legal.
O
FA captou R$ 3.123.091.258,23, até o fim de 2017: 93% do governo da Noruega, 6,2%
do governo da Alemanha do KfW e 0,5% da Petrobras. Foram despendidos até essa
data R$ 1.431.464.941,88 em apenas 89 projetos; dos quais R$ 743.248.530,40 já
foram desembolsados (posição de 30/6/2017).[1]
Muitos
interesses políticos permeiam a gestão do fundo. A composição do Comitê
Orientador do FA (COFA) inclui representantes da União, de todos os Estados da
Amazônia Legal, da entidade representativa dos municípios, dos Ministérios, do
Terceiro Setor, da FUNAI, entre outros.
Desde
2008 o Fundo Amazônia (FA) vem sofrendo alterações no texto do seu Decreto
original. Adaptações no texto visam aperfeiçoar os critérios do uso dos
recursos do fundo, segundo o COFA. Um exemplo disso aconteceu na a 22ª reunião
do COFA, por sugestão de Juliana Santiago, representante do BNDES. Ela propôs uma
alteração no item “sistemas de monitoramento do desmatamento”, trocando a frase
“em outros biomas brasileiros” por “fora da Amazônia Legal”. Alteração
aceita, na reunião, que poderá direcionar recursos para interesses governamentais
ou privados, em qualquer estado do Brasil.
É
o que acontece. Recursos do FA no Nordeste, especialmente para projetos dos
governos da Bahia (31 milhões de Reais) e do Ceará (24,5 milhões de Reais).[2] Enquanto
que no combate a incêndios e queimadas, Acre e Rondônia aprovaram apenas cinco
projetos; Mato Grosso, 15; Pará, 10; Roraima, Amapá e Amazonas, nenhum. Como se
sabe, esses estados são os que mais aparecem nos noticiários com sérios
problemas de queimadas ilegais, em parte para dar espaço ao agronegócio,
inclusive com impactos em terras indígenas e em unidades de conservação.
Só
a União aprovou nove projetos com recursos do Fundo Amazônia, totalizando 521
milhões de Reais; os estados, aprovaram 20 projetos no valor de 554 milhões de
Reais e o terceiro setor aprovou 53 projetos que somaram 595 milhões de Reais.
Apesar
de, na 22ª Reunião do COFA, Angela Skaf (BNDES) ter salientado o compromisso do
FA com a transparência, alguns indícios que constam da ata deixam entrever que
não é bem assim. Milena Medeiros (representante da Casa Civil da Presidência da
República) chegou a mencionar que o FA, desde que foi criado, teve baixo
percentual de desembolso.[3] No
caixa do FA o total do ativo circulante é de R$ 3.201.236 mil[4]
que correspondem ao montante disponível, em 31 de dezembro de 2017.
Dúvidas
não faltam sobre a utilização dos recursos do FA e a fiscalização dos projetos
onde estão envolvidos a União Federal, estados e municípios. O Relatório Anual
do Fundo Amazônia (RAFA) de 2017 está disponível no site do BNDES[5].
Os
recursos oriundos das contribuições ao chamado Fundo Amazônia estão sob a
supervisão do BNDES. Mas é uma conta que não tem a natureza de um fundo
contábil, e sim de captação de recursos não reembolsáveis para determinados
fins. A questão que é preciso avaliar é se o BNDES tem, dentre as suas funções diretas
estatutárias, a de atuação ambiental nos moldes do que pratica com relação ao
FA. Isso inclui a captação de recursos e a aprovação e monitoramento de
projetos. Se não tiver essas atribuições, poderia ser entendido como um desvio
de finalidade[6].
No
relatório das atividades (RAFA) de 2017[7],
publicado só em junho de 2018, consta o valor de R$ 350 milhões destinados a
novos projetos. O novo relatório informa que o número de projetos cresceu de 89
até o ano anterior (2016) para 100 até o final de 2017; o valor total apoiado
do FA para esses projetos foi de R$ 1,7 bilhões e o desembolso ficou em R$ 954
milhões.
Continuam
disponíveis e intocados R$ 3.201.236 mil. Por quê?
Onde estão os recursos?
Os
recursos do FA, na verdade, não estão com o BNDES, mas aplicados em dois fundos
de investimentos distintos chamados Gaia I (recursos dos doadores estrangeiros
que incluem a Noruega e a Alemanha) e Gaia II (recursos da Petrobras). Os
fundos Gaia I e Gaia II estão no Banco do Brasil.
O
ativo circulante do FA está aplicado em fundos chamados Gaia I e Gaia II, geridos
pelo Banco do Brasil, em aplicações financeiras de renda fixa - títulos públicos
brasileiros. A posição, em 31 de dezembro de 2017, é de R$ R$ 3.201.236 mil,
montante disponível para desembolsos em projetos; posição do RAFA 2017[8].
É importante, aqui, demonstrar algumas
conclusões da auditoria independente feita no FA, no RAFA 2017. Os valores estão na tabela
abaixo, mas uma observação sobre o ítem 13 (Gerenciamento de Riscos), passa quase desapercebido. Menciona que apesar
de o Fundo não apresentar “riscos
significativos de crédito, liquidez, mercado e operacional, ele
tem concentração de risco de crédito com seu Administrador (fundos investidos) conforme Nota
Explicativa, n° 4.” (Grifo meu)
Na nota explicativa Nº 4 (abaixo) a
auditoria observa “que o administrador
mantém os recursos aplicados junto ao Fundo de Investimento BB Gaia Fundo de
Investimento Renda Fixa (BB Gaia FIRF), que
possui portfólio concentrado de títulos públicos do governo brasileiro (...),
que concentra, no mínimo, 95% do seu
patrimonio em cotas do BB Gaia FIRF.”
Todo
esse recurso aplicado nos fundos de investimento Gaia I e Gaia II do Banco do
Brasil, desde 2008, até final de 2017, estaria sendo utilizado para os fins a
que foram destinados pelos seus doadores e para cumprir a finalidade
determinada na criação do Fundo Amazônia? Desvio de finalidade?
Está
claro que apenas uma parte dos recursos (menos de 1/3) foi até agora (desde
2008) utilizado para projetos contra o desmatamento na Amazônia Legal. O
restante, aplicado em fundos de investimentos no BB, poderia ser usado em qualquer
projeto de interesse do banco ou do governo federal. Já que estão financiando a
dívida pública (títulos públicos brasileiros).
O
comitê do FA aprovou a inclusão dos projetos relacionados ao programa Bolsa
Verde, na Amazônia Legal. Esse é um programa do governo federal e foi criado
pelo governo do PT. Essa aprovação se deu em 20 de outubro de 2017, na 23ª reunião do COFA. O Bolsa Verde paga R$ 300,00 às
famílias, de três em três meses, por serviços ambientais, conservação das áreas
de proteção ambiental.
E como está o
desmatamento na Amazônia?
Apesar
de serem apresentados dados positivos no RAFA 2017 que enaltece a redução do desmatamento
devido em parte aos recursos do Fundo Amazônia, as notícias na mídia são
discordantes.
Apesar
de ter sido criado em 2008, e financiado 100 projetos, o Fundo Amazônia pouco
ajudou na redução do desmatamento na Amazônia Legal.
Entre
agosto de 2016 a julho de 2017 foram desmatados, segundo o Projeto de
Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (PRODES), do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) “apenas” 6.624 km² de
corte raso!
Continua
na Parte 2
[1]
Fonte: TCU - GRUPO I – CLASSE II – Plenário TC 018.242/2017-0 Natureza:
Solicitação do Congresso Nacional. Entidade: Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES). Representação legal: Juliana Calixto Pereira
(OAB/DF 53.178).
SUMÁRIO: SCN. CPI FUNAI-INCRA 2 DA
CÂMARA DOS DEPUTADOS.
CONHECIMENTO. AUTORIZAÇÃO PARA
REALIZAÇÃO DE AUDITORIA.
TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves
de Souza, em 8 de novembro de 2017.
Páginas 3 e 4
[2]
Relatório Anual do Fundo Amazônia (RAFA), 2016, p. 32
[3] Diretrizes
e critérios 2017/2018 - Acessado em 16 de maio de 2018 http://www.fundoamazonia.gov.br/export/sites/default/pt/.galleries/documentos/diretrizes_criterios/2017_Diretrizes_e_Focos_20_10_2017.pdf
[4] Acessado em 13 de julho de 2018 http://www.fundoamazonia.gov.br/export/sites/default/pt/.galleries/documentos/rafa/Book_RAFA2017_PORT_27jun18_WEB.pdf
[5] Acessado
em 19 de julho de 2018 http://www.fundoamazonia.gov.br/export/sites/default/pt/.galleries/documentos/rafa/Book_RAFA2017_PORT_27jun18_WEB.pdf
[6]
Fonte: TCU - GRUPO I – CLASSE II – Plenário
TC 018.242/2017-0 Natureza: Solicitação do Congresso
Nacional. Entidade: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES). Representação legal: Juliana
Calixto Pereira (OAB/DF 53.178). SUMÁRIO: SCN. CPI FUNAI-INCRA 2 DA CÂMARA DOS
DEPUTADOS. CONHECIMENTO. AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE AUDITORIA. TCU, Sala
das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 8 de novembro de 2017.
Páginas 3 e 4. Fonte: Portal Planalto, com informações
do Fundo Amazônia, acessado em 17 de abril de 2018 http://www2.planalto.gov.br/acompanhe-planalto/noticias/2017/06/fundo-amazonia-apoia-89-projetos-de-preservacao
[7]
Acessado em 13 de julho de 2018 http://www.fundoamazonia.gov.br/export/sites/default/pt/.galleries/documentos/rafa/Book_RAFA2017_PORT_27jun18_WEB.pdf
[8]
Acessado em 13 de julho de 2018 http://www.fundoamazonia.gov.br/export/sites/default/pt/.galleries/documentos/rafa/Book_RAFA2017_PORT_27jun18_WEB.pdf
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