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Assim, o desastre de Mariana já estava praticamente esquecido. A justiça não foi feita nem para acalmar almas devastadas pela tragédia social e ambiental. Precisávamos de outra, nova, avassaladora, Brumadinho.
Telma
Monteiro
Quando
penso que tudo já foi escrito nessas derrotas sucessivas que a sociedade
civil vem amargando, acontece algo para comprovar o contrário. Belo Monte, Mariana,
Brumadinho, quantas mais? Digo, além de tragédias, derrotas. Assim, Belo Monte
também foi sintomática. Foi alvo da luta ambientalista há mais de 30 anos e
hoje se transformou no símbolo do casuísmo e de ações vilipendiadas.
A
sociedade mundial já viu acontecer muita coisa na história das batalhas travadas
em defesa da vida, do meio ambiente e dos direitos das minorias. Belo Monte se
tornou apenas mais uma prova da incapacidade da sociedade do século XXI de lidar
com o desenvolvimento e as pressões da globalização sobre as populações
tradicionais e os povos indígenas. Belo Monte não foi uma tragédia isolada.
A
sociedade se adaptou à Belo Monte, e o que sua construção representou. Quase virou
uma luta velha, provinciana e tacanha, para a mídia. Conseguiu simbolizar um
confronto com políticas moldadas nos anos da ditadura (agora reavivada numa
espécie de releitura). Nem a tecnologia e
seus avanços puderam mostrar outro viver para aqueles que sobreviveram à
destruição do seu modo de vida. As migalhas oferecidas pelo Estado e pelas
empresas aumentaram ainda mais a lacuna da (in)justiça social.
Assim,
o desastre de Mariana já estava praticamente esquecido. A justiça não foi feita
nem para acalmar almas devastadas pela tragédia social e ambiental. Precisávamos
de outra, nova, avassaladora, Brumadinho. Depois de mais de uma semana, ainda
assistimos todos os dias, as cenas editadas repetidas vezes, produzidas como
novelas pelas emissoras de TV. Precisam nos fazer chorar e transformar heróis
anônimos em pontos de audiência para seus patrocinadores.
A
justiça não será feita, mais uma vez. Famílias dilaceradas serão assediadas por
juristas da Vale, num processo escuso de acordos extrajudiciais.
Pronunciamentos de autoridades se sobrepõem como folhas sobre as mesas dos
burocratas de plantão, que ignoraram por completo os riscos que corre um Brasil
flagelado por hidrelétricas gigantescas na Amazônia e mineradoras hediondas
espalhadas pelos quatro cantos.
Mineradoras
de outros países associadas às brasileiras. Mineradoras que extraem todas as
riquezas que o Brasil carrega como um fardo fatal para suas populações que
temem os riscos que elas representam. Extrair minério é ferir a terra de morte,
é destruir a biodiversidade e sempre colocar os mais fracos a mercê de uma
sirene de alarme. Dormir pode ser mortal para as pessoas e o meio ambiente.
Rios de lama ou rios devastados por barragens que visam suprir de energia os
poderosos, as elites, os corruptos e as grandes empresas. Barragens de rejeitos
que consomem a autoestima de quem vive ao pé delas, pois tentam acreditar que
estarão a salvo graças aos royalties milionários que recebem as prefeituras.
Quem vai mostrar que existe o imponderável, e que consórcios milionários têm
reservas estratégicas para comprar a dor e o sofrimento?
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