segunda-feira, 20 de maio de 2019

Fundo Amazônia e alguns esclarecimentos


A Associação Vale para o Desenvolvimento Sustentável – Fundo Vale - foi criada pela empresa Vale, em 2009, e em 2016 obteve a aprovação de um recurso de R$ 35 milhões do Fundo Amazônia (FA) para um projeto chamado “Renda Florestal”. A mega empresa poluidora Vale, destruidora da floresta, que já recebeu o troféu da pior empresa do mundo, devastadora, dona da Samarco, aquela que destruiu um distrito de Mariana e pouco tempo depois deixou romper a barragem de rejeitos em Brumadinho, ceifando centenas de vidas. Ela poderia se beneficiar dos recursos do Fundo Amazônia? Atenção senhores doadores do FA, Noruega,Alemanha e Petrobras. E ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles!
Por Telma Monteiro
O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, cometeu alguns erros nas suas “conclusões”, não comprovadas, sobre o Fundo Amazônia (FA), quando se pronunciou sobre ele na última semana. Criou um imbróglio com a Noruega e a Alemanha ao afirmar que havia irregularidades no uso dos recursos do fundo, pelas ONGs. Só que as irregularidades não estão nos projetos da maioria da ONGs que buscam recursos do fundo. Ele não conseguiu comprovar nada contra elas.
Representantes da Noruega e da Alemanha soltaram uma nota afirmando que não há irregularidades detectadas por eles e que nos últimos 10 anos o desmatamento da Amazônia caiu. Será? Ainda afirmam que o Brasil seria um exemplo para o mundo quanto à preservação e controle do desmatamento.
Só que não é bem assim. Não sei em quais dados os doadores se apegam para afirmar que o fundo está sendo bem gerido. Afirmam, também, que não houve da parte do ministro ou do MMA nenhuma comunicação sobre irregularidades na gestão do fundo. Desmentido, Ricardo Salles, em mais uma saia justa derivada de sua profunda incompetência e falta de conhecimento, se absteve de aprofundar as bases sobre as quais ele fez as afirmações.
Mas há um equívoco. Falta de apuração por parte dos doadores, uma vez que nem tudo são flores na gestão do FA, pelo BNDES. A maioria das ONGs, as que apresentam projetos sérios para preservar e coibir o desmatamento na Amazônia Legal, têm dificuldades em conseguir recursos do fundo. Além disso, têm que disputar esses recursos com os órgãos dos governos estaduais, municipais e da União, além de empresas públicas. Aí, sim, podem apresentar irregularidades. Basta ler as atas do Comitê Orientador do FA (COFA), para ter uma ideia do rolo compressor dos representantes governamentais sobre as organizações não governamentais. Vale analisar o montante dos recursos do FA que se destina às várias esferas do governo.
Muitos interesses políticos permeiam a gestão do fundo. A composição do Comitê Orientador do FA (COFA) inclui representantes da União, de todos os Estados da Amazônia Legal, da entidade representativa dos municípios, dos Ministérios, do Terceiro Setor, da FUNAI, entre outros. Todos querendo um naco dos recursos.
Ricardo Salles, antes de sair atacando as ONGs, deveria se dedicar a ler as atas do COFA e analisar muitas das aplicações dos recursos do FA, que foram parar nos órgãos e empresas governamentais em todo o país. Governadores, prefeitos, fundações de bancos públicos (como a do Banco do Brasil), empresas estatais, usam os recursos do FA para projetos com chancela de sustentabilidade.
A Associação Vale para o Desenvolvimento Sustentável – Fundo Vale - foi criada pela Vale, em 2009, e em 2016 obteve a aprovação de um recurso de R$ 35 milhões do Fundo Amazônia (FA) para um projeto chamado “Renda Florestal”. A mega empresa poluidora Vale, destruidora da floresta, que já recebeu o troféu da pior empresa do mundo, devastadora, dona da Samarco, aquela que destruiu um distrito de Mariana e pouco tempo depois deixou romper a barragem de rejeitos em Brumadinho, ceifando centenas de vidas. Ela poderia se beneficiar dos recursos do Fundo Amazônia? Atenção senhores doadores do FA e ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles!
Estados do NE e de outras regiões do Brasil, como o Paraná, por exemplo, que não estão inseridos nos biomas a serem contemplados com recursos do FA, são beneficiários. Para obter recursos para implementar o Cadastro Ambiental Rural (CAR) em seus Estados, governadores recorrem ao FA. Dinheiro a fundo perdido. O uso desse recurso não parece estar sendo bem administrado ou fiscalizado. O governo federal está fazendo vistas grossas quanto à exigência do CAR, por pressão do lobby do agronegócio. Já ocorreram três prorrogações da data limite para inscrição das propriedades. Agora o prazo limite é 31 de dezembro de 2019. Muitos proprietários de terras teriam que adequar suas propriedades às exigências do CAR quanto às reservas legais, sob pena de perderem os subsídios do governo federal (juros especiais, por exemplo) e financiamentos. Só em Mato Grosso do Sul, 18% de proprietários serão beneficiados.[1]
O que é o FA?
O FA captou R$ 3.123.091.258,23, até o fim de 2017: 93% do governo da Noruega, 6,2% do governo da Alemanha do KfW e 0,5% da Petrobras. Foram despendidos até essa data R$ 1.431.464.941,88 em apenas 89 projetos; dos quais R$ 743.248.530,40 já foram desembolsados (posição de 30/6/2017).[1]
Desde 2008 o Fundo Amazônia (FA) vem sofrendo alterações no texto do seu Decreto original. Adaptações no texto visam aperfeiçoar os critérios do uso dos recursos do fundo, segundo o COFA. Um exemplo disso aconteceu na a 22ª reunião do COFA, por sugestão de Juliana Santiago, a então representante do BNDES. Ela propôs uma alteração no item “sistemas de monitoramento do desmatamento”, trocando a frase “em outros biomas brasileiros” por “fora da Amazônia Legal”. Alteração aceita, na reunião, que poderá direcionar recursos para interesses governamentais ou privados, em qualquer estado do Brasil. Ora, “fora da Amazônia Legal” é um claro descumprimento das regras de redução do desmatamento na Amazônia. Nem é preciso recordar que os recursos doados ingressam num fundo chamado Fundo Amazônia.
É o que acontece. Recursos do FA no Nordeste, especialmente para projetos dos governos da Bahia (31 milhões de Reais) e do Ceará (24,5 milhões de Reais).[2] Enquanto que para o combate a incêndios e queimadas, Acre e Rondônia foram aprovados apenas cinco projetos; Mato Grosso, 15; Pará, 10; Roraima, Amapá e Amazonas, nenhum. Como se sabe, esses estados são os que mais têm sérios problemas de queimadas para cortes de madeira ilegal, em parte para dar espaço à expansão do agronegócio, que avançam sobre terras indígenas e unidades de conservação.
Só a União aprovou nove projetos com recursos do Fundo Amazônia, totalizando 521 milhões de Reais; os estados, aprovaram 20 projetos no valor de 554 milhões de Reais e o terceiro setor aprovou 53 projetos que somaram 595 milhões de Reais.
Dúvidas não faltam sobre a utilização dos recursos do FA e a fiscalização dos projetos onde estão envolvidos a União Federal, estados e municípios. O Relatório Anual do Fundo Amazônia (RAFA) de 2017 está disponível no site do BNDES[5].
Onde estão os recursos do FA ?
Os recursos do FA, na verdade, não estão com o BNDES, mas aplicados em dois fundos de investimentos distintos chamados Gaia I (recursos dos doadores estrangeiros que incluem a Noruega e a Alemanha) e Gaia II (recursos da Petrobras). Os fundos Gaia I e Gaia II estão no Banco do Brasil. Sim, a Petrobras também contribui com o FA.
O ativo circulante do FA está aplicado em fundos chamados Gaia I e Gaia II, geridos pelo Banco do Brasil, em aplicações financeiras de renda fixa - títulos públicos brasileiros. A posição, em 31 de dezembro de 2017, é de R$ R$ 3.201.236 mil, montante disponível para desembolsos em projetos; posição do RAFA 2017[8].
É importante, aqui, demonstrar algumas conclusões da auditoria independente feita no FA, no RAFA 2017. Os valores estão na tabela abaixo, mas uma observação sobre o ítem 13 (Gerenciamento de Riscos), passa quase desapercebido. Menciona que apesar de o Fundo não apresentar “riscos significativos de crédito, liquidez, mercado e operacional, ele tem concentração de risco de crédito com seu Administrador (fundos investidos) conforme Nota Explicativa, n° 4.” (Grifo meu)
Na nota explicativa Nº 4 (abaixo) a auditoria observa “que o administrador mantém os recursos aplicados junto ao Fundo de Investimento BB Gaia Fundo de Investimento Renda Fixa (BB Gaia FIRF), que possui portfólio concentrado de títulos públicos do governo brasileiro (...), que concentra, no mínimo, 95% do seu patrimonio em cotas do BB Gaia FIRF.”
Então, senhores doadores, que tal aprofundar suas análises sobre o gerenciamento dos recursos do FA? E o ministro Ricardo Salles que tal aprender um pouco sobre o FA, antes de acusar as ONGs? Busque irregularidades, pois o problema pode estar na gestão dos recursos pelo BNDES e não nas ONGs!
Consultas

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