Ricardo Salles é a gota d’água que transbordou o copo da desfaçatez do governo Bolsonaro. Ele é a escuridão, é um sofisma ao argumentar e usar raciocínios mentirosos que produzem uma ilusão de verdades, um simulacro de regras e de realidades para enganar.
Por Telma Monteiro
A saga da luta
contra a construção da hidrelétrica Belo Monte levou ao conhecimento do mundo
as pressões que sofreram os povos tradicionais, as violações dos direitos
indígenas, o descumprimento da Convenção 169, as invasões das terras indígenas,
o crescimento incontrolável do desmatamento da Amazônia, a destruição dos grandes
rios amazônicos, a mineração em unidades de conservação. Tudo isso entrou na
pauta, então, da Rio+20 e da mídia internacional, em 2012. Mas a pauta continua sendo
atual. Pouca coisa mudou para melhor. Muita coisa mudou para pior. E vai
continuar piorando, se as políticas das reservas ambientais, por exemplo, forem
revistas, como anunciou o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em
Curitiba.
A construção da hidrelétrica Belo Monte e os enormes impactos provocados
em terras indígenas, populações ribeirinhas, no rio Xingu e na Volta Grande, se
tornaram símbolos da destruição provocada por interesses de empreiteiras e de governos corruptos. Isso
aconteceu mesmo com uma legislação forte. Depois de uma década e meia marcada
pelo caos no trato das políticas ambientais – governos do PT e de Temer - quando
achávamos que nada poderia vir de pior, surge o Big Bang ambiental criado pelo
ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.
É um tsunami de medidas que vai sepultar leis ambientais e desfazer todo
um arcabouço de conhecimento desenvolvido pela sociedade civil, pesquisadores e
cientistas para conscientizar a sociedade, formar lideranças, técnicos e
ativistas. Reconhecer a importância da preservação ambiental e a necessidade de
mudanças de atitudes dos governos e da sociedade, frente ao clima, foram processos que custaram vidas
de ícones do ativismo socioambiental como Chico Mendes (que Ricardo Salles
disse não saber quem foi) e Dorothy
Stang, para citar apenas dois. Ricardo Salles está, agora, promovendo um
desmantelamento da estrutura do Ministério do Meio
Ambiente e do Instituto
Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio). Deu início ao um Big Bang que nos levará a uma nova era de trevas. Afinal, os ambientalistas são uma escória esquerdista que se formou para atrapalhar o
progresso do país, segundo o raciocínio fascista do ministro do meio ambiente.
Ricardo Salles não
entende de meio ambiente. Desrespeita cientistas, pesquisadores, ambientalistas
e especialistas em mudanças climáticas. Considera a política ambiental “império
da irracionalidade” , chamou de “visão
ideológica distorcida” a luta pela preservação ambiental e vomita imbecilidades tais como serem as unidades de conservação um atraso para o desenvolvimento do país.
Demitiu pessoal
técnico e apto do ICMBIO e o aparelhou com policiais militares. Ricardo Salles é um boneco de ventríloquo preparado
para legitimar, com os instrumentos disponíveis no MMA, a destruição da
Amazônia, das UCs e dos povos da floresta, escancarando as nossas riquezas
intocáveis às mineradoras do mundo inteiro e ao agronegócio. Ricardo Salles é o
“aspone” na antessala da ministra da Agricultura, para fazer o serviço sujo de
transformar o MMA em “apêndice” do ministério do agronegócio.
Ricardo Salles é a
gota d’água que transbordou o copo da desfaçatez do governo Bolsonaro. Ele é a
escuridão, é um sofisma ao argumentar e usar raciocínios mentirosos que
produzem uma ilusão de verdades, um simulacro de regras e de realidades para
enganar.
Como se já não nos
bastassem os golpes desferidos pelo ministro da Educação, Abraham
Weintraub, que vai retirar disciplinas como
Filosofia e Sociologia do currículo das escolas e cortar as verbas das
universidades federais; ou pela ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves, preocupada
com as cores das roupas das meninas e meninos, uma analogia à orientação sexual,
ou de pregar a submissão da mulher ao homem; ou pelo retrocesso da ministra da
Agricultura, Tereza Cristina, ao defender a liberação de 86 novos produtos
elaborados com agrotóxico; ou pelo presidente da República ao incitar o assassinato
sem punição de invasores de propriedades rurais; ou pelo ministro da Economia,
Paulo Guedes, ao criar um projeto de reforma da Previdência sem apresentar as
planilhas com os números que levaram sua equipe a concluir o valor do rombo; ou pelo país se submeter aos humores de Olavo de Carvalho, autointitulado filósofo e guru do
bolsonarismo e condecorado por Bolsonaro com a Ordem do Rio Branco; ou pelo
ministro da Justiça, Sérgio Moro, coitado, que não conseguiu emplacar o projeto
de combate ao crime e nem a si mesmo. Some-se a isso um
Congresso eleito na esteira de uma direita sem preparo, sem cultura básica e sem noção da importância de um projeto de
futuro para as próximas gerações de brasileiros.
Somos 147 milhões
de eleitores aptos no Brasil, 58 milhões elegeram Bolsonaro presidente, brasileiros
que se quer poderão, um dia, dizer que foram enganados. Bolsonaro nunca
escondeu a que vinha. E está cumprindo as promessas de campanha. Portanto, os 58
milhões de brasileiros que o elegeram são coniventes.
Esse presidente
sinalizou que deixaria terra arrasada na floresta, nas escolas, nas universidades,
nas famílias, no campo do conhecimento, na ciência, na conquista do respeito à
diversidade étnica e sexual, nos direitos individuais e coletivos. Impossível chamar
Bolsonaro de governante, ele não governou até agora, mas se deixa governar pela
prole (zeroum, zerodois e zerotrês), por um Olavo, por um Guedes, por uma Tereza
Cristina e o “seu” agronegócio, por mineradoras, pela crença religiosa presente
no Estado que deveria ser laico, por um “deus” que deve “iluminar” o presidente
do Banco do Brasil para baixar os juros para o agronegócio, e pelos militares. Ele é mediano, semi analfabeto, não estudou a
Constituição, apesar de ficar 27 anos vegetando na Câmara dos deputados na
bancada evangélica, depois de, aos 33 anos, ser defenestrado do quartel por
motivos ainda a esclarecer. Também ousou
colocar as mulheres brasileiras à disposição para, “fazer sexo”, dos turistas
internacionais, em uma das piores falas de um presidente da República já
registrada. Ele superou o Trump!
Anos de ativismo
sério no preparo da sociedade para enfrentar os riscos ambientais decorrentes
das mudanças climáticas estão sendo jogados pelo ralo. Retrocesso é o nome. Agora
o desastre é iminente. Para fechar com chave de ouro, eu não poderia deixar de
mencionar as incríveis performances do presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e
do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, que
visitaram uma mineradora de amianto em Minaçu
(GO) e pediram a liberação do asbesto ou amianto que, no entendimento da Organização
Mundial de Saúde (OMS), é um mineral altamente cancerígeno. A luta contra o
amianto foi árdua, levou mais de duas décadas para que o STF, em 2017,
concedesse a liminar decretando seu banimento e proibindo a sua utilização.
O retrocesso que
pode vir das políticas coordenadas pelo governo Bolsonaro, a continuar nesse ritmo,
deverá bater todos os recordes. Quanto às áreas prioritárias como saúde,
segurança, emprego, infraestrutura, ele ainda não começou a governar!
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