Imagem apresentação Belo Sun |
Telma Monteiro
O projeto Volta Grande, nome da mina da Belo Sun Mining, pretende retirar 76 t de ouro em 10 anos. A Belo Sun tem 74 quilômetros quadrados ou 74 mil ha de área já reservados, no DNPM, para minerar ouro na Volta Grande do Xingu. Essa área chega até os limites das terras indígenas Paquiçamba, Arara da Volta Grande e Ituna/Itatá, área de perambulação dos indígenas isolados.
Está tramitando no
Congresso o PL 191/2020[1] para liberar mineração,
exploração de hidrocarbonetos e recursos hídricos para geração de energia
elétrica em Terras Indígenas (TIs). Um estudo conjunto da USP, UFMG e ISA
estima que, se o projeto for aprovado, ele deverá impactar 23% da Amazônia. No
período de 1994 a 2020 (em 26 anos) foram requeridos 2.113 pedidos de pesquisa
de ouro em Terras Indígenas e Unidades de Conservação da Amazônia. Mas, só no
período de 2010 a 2020 (últimos10 anos) foram 1.174 pedidos.
A proposta do PL
191/2020, com trâmite prioritário, ameaça 863 mil quilômetros quadrados de
florestas e 222 grupos indígenas. Esse contingente incrementa, anualmente, 5
bilhões de dólares de serviços ecossistêmicos entre alimentos, mitigação de
emissões de carbono e regulação do clima. O projeto de iniciativa do poder
executivo foi assinado pelo ministro de Minas e Energia Bento Albuquerque e
pelo ex-ministro da Justiça, Sergio Moro.
Além da perda dos
serviços ambientais, o PL 191/2020, se aprovado, pode levar à perda de 160 mil
quilômetros quadrados de floresta na Amazônia o que equivaleria a 20 anos de
desmatamento. Só para efeito de comparação, a área da Alemanha é de 357 mil
quilômetros quadrados e a área da bacia hidrográfica do Tapajós é de 764 mil
quilômetros quadrados.
Outros dados assustadores
merecem ser mencionados, como os 2.100 novos pedidos de pesquisa minerária que
devem afetar 85 territórios indígenas e 64 unidades de conservação nos estados
do Amazonas e Roraima. Só a TI Baú, no Pará, tem pedidos de pesquisa minerária
em 471 mil hectares, o que equivale a ¼ do seu território.
Mineração de ouro em Belo
Monte
Na semana passada (7 de
novembro de 2021) um protesto em Altamira, no Pará, lembrou que na esteira da hidrelétrica
Belo Monte, no rio Xingu, a mineradora canadense, Belo Sun Mining, está prestes
a iniciar a instalação da mina para a extração de ouro ao lado da hidrelétrica,
próxima ao barramento do sítio Pimental, na Volta Grande[2]. A consulta prévia, livre
e informada aos povos indígenas ainda não aconteceu.
O projeto da mineradora
canadense, licenciada pelo estado do Pará, só foi possível porque a
hidrelétrica de Belo Monte foi construída. Uma verdadeira “janela de
oportunidade” provocada pelo desmatamento da região da Volta Grande do Xingu em
decorrência dos impactos da construção de Belo Monte. O projeto Volta Grande,
nome da mina da Belo Sun Mining, pretende retirar 76 t de ouro em 10 anos. A
Belo Sun tem 74 quilômetros quadrados ou 74 mil ha de área já reservados, no
DNPM, para minerar ouro na Volta Grande do Xingu. Essa área que chega até os
limites das terras indígenas Paquiçamba, Arara da Volta Grande e Ituna/Itatá, área
de perambulação dos indígenas isolados. O Estudo do Componente Indígena deve mostrar
claramente que essas terras sofrerão impactos cumulativos da exploração de ouro
a céu aberto, que produzirá, além da riqueza, toneladas de resíduos que deverão
ser descartados.
Apesar das licenças
concedidas pelo Estado do Pará, o projeto Volta Grande da Belo Sun Mining não
pode minerar graças à decisão do Tribunal Regional Federal (TRF1) que suspendeu
o licenciamento em dezembro de 2017 até que fosse realizada a Consulta Pública
aos indígenas e o Estudo do Componente Indígena das terras afetadas. O processo
foi retomado em abril de 2018 condicionado à apresentação do Plano de Trabalho
da Consulta. Em 2019 o processo foi novamente suspenso pelo Tribunal de Justiça
do Pará.
Atualizando: em 19 de
março de 2021 a procuradoria da Funai expediu nota jurídica à presidência da
Funai pedindo a suspensão de procedimentos junto aos povos indígenas, devido à
pandemia de COVID 19. Atualmente recomeçaram as tratativas para dar sequência à
Consulta aos povos indígenas e à elaboração do Estudo do Componente Indígena
(ECI).
Desmatamento, o primeiro
passo
Dados do Imazon mostram
um aumento do desmatamento de 57%, ou 10.476 quilômetros quadrados, entre 2020
e 2021, a pior taxa dos últimos 10 anos. O desmatamento ilegal é o primeiro
passo para a mineração e o garimpo que afetam unidades de conservação e terras
indígenas. As imagens do desmatamento são cada vez mais estarrecedoras. A
aquisição de grandes porções de floresta na Amazônia Legal migrou para o sul do
Pará, e a madeira é extraída para exportação e consumo interno.
O método usado pelos
desmatadores é bastante simples, como me narrou um madeireiro aqui no Brasil. O
grileiro quer vender a mata e a apresenta para um intermediário que vai buscar
o comprador da madeira. O valor da área a ser desmatada vai depender do
quantitativo de árvores nobres que ela contém. É feito um inventário das
madeiras nobres que estão na área, independente da reserva legal da propriedade
que são 80% na Amazônia Legal. Feito o inventário, o preço é acertado conforme
o “estoque” disponível. Mas, aí vem o pulo do gato: no inventário, o grileiro, “dono”
da terra, e o intermediário costumam acrescentar árvores da reserva legal da
propriedade, sem que o órgão que emite a autorização possa conferir. Uma área
pode valer desde R$ 600,00 a R$ 40 mil por hectare, dependendo da quantidade de
madeira nobre existente.
Firmado o preço, o
intermediário vende a madeira inventariada para o madeireiro que pede ao Ibama
a autorização para extração da madeira na área fora da reserva legal. Fiscais
do Ibama analisam o pedido, vão ao local e demarcam o perímetro inventariado e
a quantidade de m³ que poderá sair daquela área. Então, essa madeira da área
inventariada passa a ser certificada, com localização por georreferenciamento,
e que será retirada pelos madeireiros. Com a certificação emitida, o Ibama
passa a considerar que a madeira inventariada daquela área, georreferenciada da
propriedade, é legal. Mas, não acontece assim, na maioria dos casos, pois
muitas árvores nobres são retiradas da reserva legal (restrita) usando a
documentação legal da área certificada.
Infelizmente, a
fiscalização acaba sendo omissa por falta de fiscalização em consequência do
desmanche que o ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, junto com o
presidente Jair Bolsonaro, impuseram ao Ibama. As carretas saem carregadas das
áreas de desmate autorizado, com as toras legais e ilegais, em direção às
serrarias do norte do Mato Grosso e sul do Pará. Tecnicamente, legalizada a
madeira com parte extraída ilegalmente da reserva legal, passa pelos postos de
fiscalização onde a documentação é carimbada.
Outro depoimento, ainda,
informa que grandes negociadores internacionais de madeira para exportação, em
especial chineses, oferecem, antecipadamente, ao intermediário dez vezes o
valor de mercado da madeira a ser extraída. A velocidade com que o desmatamento
avança no sul do Pará vai dando lugar ao agronegócio e à mineração que invade
terras indígenas e unidades de conservação.
Eis aí um dos porquês do
aumento estratosférico do desmatamento apontado pelo Imazon.
[1] “Regulamenta o §
1º do art. 176 e o § 3º do art. 231 da Constituição para estabelecer as
condições específicas para a realização da pesquisa e da lavra de recursos
minerais e hidrocarbonetos e para o aproveitamento de recursos hídricos para
geração de energia elétrica em terras indígenas e institui a indenização pela
restrição do usufruto de terras indígenas.” https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2236765
[2] “suspensão em curso
e potencial cancelamento de suas licenças ambientais” https://xinguvivo.org.br/wp-content/uploads/2021/08/Belo-Sun-Corp_CartaOSC_PT.pdf
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